Alexandre de Moraes, Marco Rubio e a lição de Riobaldo, que o gringo desconhece: O que a vida quer da gente é coragem
Mineiro como Guimarães Rosa, o jurista Kakay cobra investigação sobre Eduardo Bolsonaro, que comete crimes contra a soberania do Brasil à luz do dia
Que fique claro: Se os EUA adotarem algum tipo de sanção contra Alexandre de Moraes, o ataque não será a ele, mas ao Estado brasileiro, porque o ministro tem agido como autoridade da cúpula do Judiciário, não como pessoa física.
Nesta quarta-feira, 21/05, o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, respondendo a um questionamento durante audiência no Comitê de Relações Exteriores na Câmara dos Representantes dos EUA, disse que há “grande possibilidade” de que o governo daquele país adote sanções contra o ministro do STF.
O jurista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, definiu bem de quem é a responsabilidade pelo movimento em curso naquele País para obstruir a justiça no Brasil, em um processo crucial para a democracia brasileira. É de Eduardo Bolsonaro, que, como deputado federal, tem se articulado com autoridades estrangeiras contra a soberania do Brasil.
“A mídia brasileira noticiou, não há muito tempo, que o Deputado Federal Eduardo Bolsonaro, teria ido aos EUA para manter contato com autoridades americanas, com o intuito de pedir que o Governo dos EUA fizesse alguma intervenção na Justiça brasileira. Especialmente para responsabilizar criminal e istrativamente os Ministros da Corte por atos praticados no exercício da jurisdição da Casa. Inclusive na matéria constava bizarra manifestação do pai do deputado, o ex -presidente Jair Bolsonaro, apoiando a intervenção norte americana”, escreveu.
“Onde anda a PF e o MP?”, indagou.
Para Kakay, um dos mais experientes criminalistas brasileiros, a ação de Eduardo Bolsonaro caracteriza pelo menos dois crimes.
Perguntei a ele que crimes seriam esses. A resposta de Kakay:
Art. 359-I. Negociar com governo ou grupo estrangeiro, ou seus agentes, com o fim de provocar atos típicos de guerra contra o País ou invadi-lo:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.
§ 1º Aumenta-se a pena de metade até o dobro, se declarada guerra em decorrência das condutas previstas no caput deste artigo.
§ 2º Se o agente participa de operação bélica com o fim de submeter o território nacional, ou parte dele, ao domínio ou à soberania de outro país:
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos
Art. 359-K. Entregar a governo estrangeiro, a seus agentes, ou a organização criminosa estrangeira, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, documento ou informação classificados como secretos ou ultrassecretos nos termos da lei, cuja revelação possa colocar em perigo a preservação da ordem constitucional ou a soberania nacional:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 12 (doze) anos.
§ 1º Incorre na mesma pena quem presta auxílio a espião, conhecendo essa circunstância, para subtraí-lo à ação da autoridade pública.
§ 2º Se o documento, dado ou informação é transmitido ou revelado com violação do dever de sigilo:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 15 (quinze) anos.
§ 3º Facilitar a prática de qualquer dos crimes previstos neste artigo mediante atribuição, fornecimento ou empréstimo de senha, ou de qualquer outra forma de o de pessoas não autorizadas a sistemas de informações:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
§ 4º Não constitui crime a comunicação, a entrega ou a publicação de informações ou de documentos com o fim de expor a prática de crime ou a violação de direitos humanos.
A pergunta ao ministro de Donald Trump foi feita pelo deputado republicano Cory Mills, da Flórida, que invocou a Lei Global Magnitsky, criada nos EUA em 2012, para punir autoridades estrangeiras acusadas de corrupção ou graves violações de direitos humanos.
E Eduardo Bolsonaro não agiu sozinho na operação contra a soberania do Brasil. Seu colega, o deputado federal Felipe Barros, do PL do Paraná, contou como eles têm se articulado com autoridades estrangeiras.
“Na semana ada, viajei aos EUA e falei com o deputado norte-americano Cory Mills sobre os problemas que brasileiros e americanos enfrentam com o judiciário do nosso país. Hoje o deputado perguntou a Marco Rubio, Secretário de Estado Americano, o que será feito a respeito disso e recebeu, como resposta, o anúncio da grande possibilidade de virem sanções por violação dos direitos humanos”, escreveu, em sua conta no Instagram.
“Há um alarmante declínio dos direitos humanos no Brasil: Temos visto censura generalizada em perseguição política, atingindo toda a oposição, incluindo jornalistas e cidadãos comuns. O que estão fazendo agora é a iminente prisão politicamente motivada do ex-presidente Bolsonaro. Essa repressão extrapolou as fronteiras do Brasil, afetando pessoas em solo norte-americano. Um artigo do Financial Times em 2023 tratou disso. O que o senhor pretende fazer? E o senhor consideraria o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes pela Lei Global Magnitsky”, perguntou o parlamentar.
O ministro de Donald Trump respondeu: “Isso está em análise neste momento. E há grande possibilidade de acontecer.”
Há uma semana, em gravação feita em frente ao Capitólio (sede do Legislativo norte-americamo) ao lado de Eduardo Bolsonaro e do neto do ex-ditador brasileiro João Figueiredo, Felipe Barros antecipou, de certa forma, o que aconteceria:
“Tivemos uma reunião excelente com o deputado Cory Mills, que é o presidente do Subcomitê de Inteligência sobre as Relações Internacionais, nos recebeu muito bem e vai haver uma troca de informações muito relevantes para a democracia brasileira, entre nós e eles aqui”.
Quem viu o depoimento do brigadeiro Carlos Alberto Baptista Júnior nesta quarta-feira, no STF, sabe que de democrata esse grupo bolsonarista não tem nada. Baptista Júnior foi comandante da Aeronáutica no governo Bolsonaro, e contou em detalhes como estava sendo executado o plano para impedir a posse de Lula em 1o. de janeiro de 2023.
A ação seria violenta, com a prisão ilegal de Alexandre de Moraes, na época presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Baptista Júnior disse que o golpe só não se concretizou porque não houve unidade das forças armadas. Ele e o comandante do Exército, general Freire Gomes, se opam e, por isso, foram perseguidos, a partir de ordem do general Braga Netto, que tinha sido candidato a vice na chapa derrotada por Lula.
Se enquadrado na Lei Global Magnitsky, Alexandre de Moraes poderá ter cartões bloqueados e redes suspensas. Se tiver conta bancária ou bens nos EUA, também poderão ser bloqueados. Essa ameaça, que pode ser entendida como coação, seria suficiente para fazer o ministro do STF recuar?
A resposta que Alexandre de Moraes deu em fevereiro, quando explodiu o caso da plataforma Rumble, dos EUA, dá a medida de como ele encara essas ameaças.
"Pela soberania do Brasil, pela independência do Poder Judiciário e pela cidadania de todos os brasileiros e brasileiras. Pois deixamos de ser colônia em 7 de setembro de 1822 e, com coragem, estamos construindo uma República independente e cada vez melhor, independente e democrática. E construindo com coragem. Como sempre lembra a eminente ministra Cármen Lúcia, citando Guimarães Rosa: ‘O que a vida quer da gente é coragem’", disse.
Essa frase sobre coragem é do personagem Riobaldo, do livro Grande Sertão: Veredas. Ex-jagunço, ele compara a vida a um rio: às vezes tranquilo, outras vezes repleto de surpresas e desafios.
Kakay é de Patos de Minas, distante de Curvelo, a entrada do Grande Sertão. Mas, mineiro como Carmem Lúcia, se vê na obra de Guimarães Rosa, embora Minas seja um país, com rios caudalosos, sem mar, e culturas diversas. Ele já citou Riobaldo em artigos jurídicos.
Alexandre de Moraes é de São Paulo, filho de um advogado que nasceu em Tietê, interior paulista, a mesma cidade de Michel Temer, que nomeou Alexandre de Moraes para o STF.
Moraes se formou advogado na Universidade de São Paulo, no Largo São Francisco, a mesma em que também se formaram Temer e outros juristas de renome no País, alguns de direita, outros de esquerda, como Gofredo da Silva Telles e Fábio Konder Comparato.
No ado mais remoto, a Faculdade do Largo São Francisco teve como alunos os poetas Castro Alves e Álvares de Azevedo, assim como o abolicionista Luiz Gama. Ao contrário de Dias Toffoli e Paulo Teixeira, também formados lá e contemporâneos, Alexandre de Moraes se posicionava mais à direita.
O ministro do STF não é, portanto, Riobaldo, nem viveu a cultura do sertão, mas, certamente, enfrenta hoje um rio turbulento.
Imagino a pressão que deva receber, sobretudo por antigos amigos e aliados. Uma coisa já sabemos. Em seus dias mais difíceis, Alexandre de Moraes tem a oportunidade de refletir, como poucos de nós, sobre a profundidade dos versos do personagem de Guimarães Rosa.
Diz Riobaldo:
“Estes versos não cantei para ninguém ouvir, não valesse a pena. Nem eles me deram refrigério. […] O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais, no meio da alegria, e inda mais alegre ainda no meio da tristeza! Só assim de repente, na horinha em que se quer, de propósito – por coragem. Será? Era o que eu às vezes achava. Ao clarear do dia“.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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