“A estratégia do governo de frente ampla pode não estar funcionando”, diz Breno Altman
Jornalista alerta para risco de desgaste da frente ampla antes de 2026
247 - O jornalista Breno Altman analisou a recente reforma ministerial do governo Lula e a nomeação da deputada Gleisi Hoffmann para a Secretaria de Relações Institucionais durante entrevista ao Bom Dia 247. Para Altman, a escolha pode representar uma contradição na estratégia política do governo, que busca ampliar sua base de apoio. Ele também destacou a queda de popularidade do presidente e questionou se a manutenção da chamada "frente ampla" é sustentável.
“Gleisi Hoffmann é um quadro político de enorme qualidade, de posições políticas muito nítidas. Ela foi uma crítica duríssima do neoliberalismo e das políticas de austeridade, uma debatedora implacável contra as forças de direita no Brasil, não apenas contra o bolsonarismo, mas também contra a direita liberal”, afirmou Altman.
O jornalista destacou que a entrada da deputada no governo pode sinalizar uma mudança de rumo, mas questionou se essa alteração será efetiva. “Isso representa uma mudança da política do governo Lula em relação à frente ampla? Não sei, não tenho a mínima ideia. Eu temo que alguém que diga que sabe o que vai acontecer esteja exorbitando as informações disponíveis. É uma situação delicada.”
Contradição na estratégia da frente ampla
Altman ressaltou que a frente ampla tem sido o principal eixo político do governo desde a eleição de 2022. Ele apontou que, até agora, a estratégia buscava consolidar e expandir essa aliança, trazendo para a base do governo partidos como União Brasil, PSD, PP e Republicanos, que não estiveram na coligação original. Nesse sentido, a nomeação de Gleisi Hoffmann, uma figura mais alinhada à esquerda, pode gerar atritos.
“Se essa era a ideia, por que a Secretaria de Relações Institucionais a a ser ocupada por uma mulher tão combativa quanto Gleisi Hoffmann, que está bastante mais à esquerda do que Alexandre Padilha? Não há uma contradição entre essas duas coisas?”, questionou.
Segundo Altman, uma possível explicação seria uma tentativa do presidente Lula de adotar uma postura mais dura com setores da frente ampla, estabelecendo um novo tipo de negociação com aliados. “Pode ser que o presidente Lula calcule que é necessário ter mais dureza no trato com esses atores para tentar enquadrá-los mais pela dor do que pelo amor. Certamente, Gleisi Hoffmann dá mais energia ao governo junto à militância petista, anima a base de esquerda e injeta ânimo no eleitorado mais progressista.”
Dilema econômico e político
O jornalista também abordou a relação entre política e economia na estratégia do governo, destacando que o modelo adotado até agora busca um equilíbrio entre as demandas populares e os interesses do capital financeiro.
“O governo tenta reproduzir, em novas condições, uma política que foi implementada especialmente no primeiro mandato do presidente Lula. O objetivo é colocar arroz e feijão no prato dos pobres sem mexer muito no bolso dos ricos”, explicou.
Altman lembrou que o novo arcabouço fiscal foi desenhado para acalmar as pressões do mercado e garantir credibilidade, enquanto políticas sociais e de desenvolvimento econômico seguem sendo implementadas. No entanto, mesmo com resultados macroeconômicos positivos, como o crescimento do PIB e a queda do desemprego, a popularidade do governo não acompanhou esses números.
“Embora essa estratégia tenha números positivos – crescimento do PIB em 3,4%, aumento da renda dos trabalhadores, queda do desemprego – ela não está conseguindo angariar apoio popular. O presidente Lula sabe disso. E já estamos bastante próximos das eleições de 2026.”
Segundo Altman, o governo enfrenta um ime: se continuar ampliando a frente ampla, será pressionado a fazer mais concessões ao capital financeiro e ao agronegócio, o que pode afastá-lo da sua base popular. Por outro lado, se adotar medidas mais à esquerda, corre o risco de rachar sua coalizão política.
“Se o governo optar por manter e expandir a frente ampla, terá que fazer mais concessões programáticas à direita. Mas se fizer isso, não estará reforçando justamente as políticas que tornam o governo impopular? Por outro lado, se decidir adotar políticas mais agressivas, favoráveis ao povo e contrárias ao capital financeiro, como será possível manter essa frente ampla?”
Reforma agrária e o impacto nas alianças
A incerteza sobre os rumos do governo, segundo Altman, ficou evidente no discurso recente de Lula durante a entrega de terras para famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O presidente fez declarações enfáticas sobre sua trajetória política e os desafios enfrentados por sua istração.
“Lula disse: ‘Eu sei de onde venho e para onde vou. Eu sei quem são meus aliados e quem são os oportunistas que se aproximam de mim para extrair benefícios da Presidência da República’. Foi um discurso fortíssimo”, destacou Altman.
A reforma agrária, segundo ele, é um exemplo de como o governo pode enfrentar dificuldades para equilibrar sua base de apoio. Medidas como a distribuição de terras e o fortalecimento da agricultura familiar são bem recebidas pela esquerda, mas geram resistência no agronegócio e no Congresso.
“Para onde o governo vai girar? Para uma política mais à esquerda, com medidas na economia mais favoráveis ao povo, contrariando o capital financeiro e o agronegócio, o que pode reduzir a frente ampla? Ou tentará manter e até expandir essa coalizão com mais concessões?”, questionou.
Crítica à condução da economia
Altman também criticou a demora do governo em tomar medidas estruturais para conter a inflação dos alimentos, que afeta diretamente a popularidade do presidente. Ele defendeu a adoção de um imposto sobre exportação para reduzir a dependência do Brasil de commodities e aumentar a produção de alimentos para o mercado interno.
“O governo não quis ter uma crise com o agronegócio e não estabeleceu um imposto de exportação. Mas esse imposto seria fundamental para impedir que o agronegócio continue desviando sua produção para o exterior, agravando a inflação dos alimentos no país”, afirmou.
Ele destacou que há dois caminhos para enfrentar esse problema: “Uma maneira é o imposto de exportação, que redireciona o capital agrário para a produção de alimentos. A outra é a reforma agrária, distribuindo terras às famílias camponesas e fortalecendo a agricultura familiar.”
A estratégia precisa mudar?
Para Altman, a estratégia atual do governo não está funcionando e precisa ser revista se Lula quiser recuperar popularidade e chegar competitivo em 2026.
“A estratégia de frente ampla não está funcionando. Creio que seria falho manter essa visão. O governo precisa recuperar popularidade e ter maior competitividade nas eleições. Eu gostaria de ver uma revisão dessa estratégia, com medidas mais profundas de apoio ao povo”, afirmou.
Ele destacou que, em algumas áreas, o governo dá sinais de mudança, mas em outras mantém uma postura hesitante. “Por exemplo, há uma letargia do governo em agir contra a inflação dos alimentos. Foram adotadas algumas medidas paliativas, mas nada estrutural.”
A dúvida central, segundo Altman, é se o governo continuará tentando equilibrar interesses divergentes ou se fará uma inflexão à esquerda. “Ainda não está claro qual é a trilha que o governo vai seguir. Mas, na minha opinião, a estratégia atual precisa ser revisada.” Assista:
❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com [email protected].
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: