"Ascensão da China representa reequilíbrio histórico", diz Jeffrey Sachs
Economista norte-americano afirma que crescimento chinês põe fim à ordem centrada no Ocidente e critica visão ideológica de superioridade civilizacional
247 – Em entrevista ao canal do professor Glenn Diesen no YouTube, o economista Jeffrey Sachs analisou as transformações da ordem mundial e apontou a ascensão da China como um fenômeno de reequilíbrio histórico. Reconhecido por sua atuação internacional em temas de desenvolvimento e por assessorar governos e organismos multilaterais, Sachs ofereceu uma leitura de longo prazo sobre a rivalidade entre Estados Unidos e China, destacando o declínio do domínio ocidental e o retorno da Ásia ao protagonismo econômico.
“A maior parte da população mundial vive na Ásia, cerca de 60%. Durante a maior parte da história, isso também significou cerca de 60% da produção econômica global”, afirmou Sachs. Ele lembrou que esse cenário mudou drasticamente com a Revolução Industrial e a ascensão das potências europeias e dos Estados Unidos, o que resultou em um desequilíbrio que, agora, começa a ser corrigido.
O “século de humilhação” e a reconstrução da China
Sachs contextualizou o atual protagonismo chinês como resultado de um processo de reconstrução iniciado após o chamado “século de humilhação”, período marcado por invasões estrangeiras, guerras e submissão à dominação imperialista. “Em 1950, a China representava apenas 2% da produção global, embora tivesse cerca de 20% da população mundial”, explicou. Para ele, a fundação da República Popular da China, em 1949, marca o início da recuperação de um papel histórico central que o país ocupou por milênios.
“A China dominava o mundo em diversas tecnologias antes da ascensão europeia: pólvora, papel-moeda, navegação oceânica. O que estamos vendo agora é um retorno à normalidade histórica”, declarou Sachs.
Crítica ao excepcionalismo e à ideologia da superioridade
Um dos pontos mais contundentes da entrevista foi a crítica de Sachs à ideologia ocidental que naturalizou a dominação europeia e norte-americana nos últimos séculos. Ele associou essa visão a crenças profundamente enraizadas em ideologias coloniais e racistas, que ainda moldam o pensamento geopolítico no Ocidente. “A China é vista com alarme, com desdém, com medo. Não conheço nenhum líder americano que diga: ‘É natural que a China esteja indo bem’. O que se ouve é que a China é uma ameaça”, afirmou.
Sachs denunciou o que chama de “visões superficiais e racistas” que sustentam o discurso de contenção da China e criticou o conceito de “excepcionalismo americano”, segundo o qual os Estados Unidos teriam o direito natural de liderar o mundo.
Um modelo diplomático distinto
Para o economista, a China representa não apenas uma potência econômica em ascensão, mas um modelo civilizacional com uma filosofia política distinta da tradição ocidental. Ele traçou um contraste entre a história fragmentada da Europa — marcada por séculos de guerras entre reinos rivais — e a trajetória da China como estado centralizado, baseado na filosofia confuciana e na busca da harmonia interna.
“A China se unificou em 221 a.C. e, por mais de 2.000 anos, manteve um Estado istrativo centralizado. Ao contrário da diplomacia ocidental, marcada pela anarquia entre estados, a China pensa em ordem interna e não tem um histórico de imperialismo externo”, disse Sachs. Como exemplo, mencionou que entre 1368 e 1839 — do início da dinastia Ming até a Primeira Guerra do Ópio — o país quase não se envolveu em guerras com seus vizinhos.
O fim da ordem centrada no Atlântico Norte
Sachs encerrou a entrevista afirmando que a atual transição global não envolve apenas a China, mas também o crescimento da Índia, do Sudeste Asiático e de países da Ásia Ocidental. Para ele, o mundo está deixando para trás a era dominada pelo Atlântico Norte e caminhando para uma nova configuração multipolar.
“O desequilíbrio que favoreceu o Ocidente está chegando ao fim. Estamos assistindo ao fim de uma era e ao início de uma nova forma de organização internacional, menos baseada na dominação e mais no reequilíbrio histórico”, concluiu. Assista:
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